dezembro 28, 2009
A verdade é que...
De nada vale mascararmos de vermelho os sorrisos.
Nem plantarmos rosas nas palavras já gastas pelo mau uso.
Tal como o amor, a amizade só faz sentido quando se torna incansável.
E os gestos nunca mais serão pensados.
dezembro 23, 2009
dezembro 18, 2009
in the rain...
dezembro 14, 2009
O roubador do Verão
Há dias fui à procura do roubador do Verão.
Tinha os músculos empedernidos e a certeza de que o sangue se me congelara nas veias. Receava mesmo que, fosse eu distrair-me uma vez só e a ponta do nariz caía-me aos pés. Mesmo assim avancei determinada serra do Caldeirão acima, onde, disseram-me, ele costuma acoitar-se por alturas de Dezembro. Normalmente demora uns quantos dias a empacotar a estação dentro dos velhos baús de madeira, avisaram-me, porque sempre tem para domar uns cinco ou seis meses de temperaturas perigosamente atraídas por uma bipolaridade cada vez mais crónica, graus inflamados por uma vaga de fenómenos com tendências extremistas, atmosferas carregadas de fascínio pelos míticos ares secos vindos lá do Norte d’África, ventos irascíveis que remoinham muito bem por onde lhes apetece e umas quantas chuvas eternamente vacilantes que escorregam como enguias acabadas de sair do mar. Enfim, não é fácil…
Encontrei-o sentado num montinho de terra enlameada, rodeado por troncos de árvores enrugadas, de onde pendiam galhos entristecidos pela saudade das folhas. No chão rareavam já as moitas verdes onde até há bem pouco tempo dançavam deliciosos cálices de pétalas coloridas. Um deserto de calor…
- Hei, chamei-o. És tu o roubador do Verão?
Ele olhou-me de soslaio sem esboçar um leve cumprimento que fosse. Parecia estar a descansar e reparei que tinha, presas aos dedos, três malas forradas a xadrez escocês trancadas a cadeado. Então e o raio dos baús? pensei um bocado confusa.
- Fazes o favor de soltar o Verão e desaparecer daqui de uma vez por todas? gritei-lhe, dando à voz enrouquecida pelo frio a força que faltava ao débil argumento. Não me preparara lá muito bem para o confronto com o miserável das estepes e contrariando a lógica que está sempre presente nestas ocasiões, senti as faces enrubescerem como se lhes tivessem ateado fogo, não sei bem se o da raiva ou o da vergonha.
O estúpido atacou-me então com um sorriso trocista por cima do ombro. Atirei-lhe logo uma pedra, como fazemos aos cães quando os queremos a fugir para longe com o rabo entre as pernas, mas em vez de lhe acertar, ficou-lhe a três centímetros da testa, suspensa no ar.
-És parva ou quê?
Embaraçada com o fiasco da pedrada demorei-me na resposta. E ele, aproveitando-se do meu estado titubeante, flectiu à traição os joelhos para ganhar balanço e partiu em linha recta na direcção do céu, mas não sem antes traçar um voo rasante por cima da minha cabeça, o que provocou uma deslocação de ar tão forte que me arrancou a ponta do nariz. Não acredito...
Desci a serra amuada. E também sem conseguir respirar lá muito bem.
Da próxima vez que o encontrar ele vai ver!
Tinha os músculos empedernidos e a certeza de que o sangue se me congelara nas veias. Receava mesmo que, fosse eu distrair-me uma vez só e a ponta do nariz caía-me aos pés. Mesmo assim avancei determinada serra do Caldeirão acima, onde, disseram-me, ele costuma acoitar-se por alturas de Dezembro. Normalmente demora uns quantos dias a empacotar a estação dentro dos velhos baús de madeira, avisaram-me, porque sempre tem para domar uns cinco ou seis meses de temperaturas perigosamente atraídas por uma bipolaridade cada vez mais crónica, graus inflamados por uma vaga de fenómenos com tendências extremistas, atmosferas carregadas de fascínio pelos míticos ares secos vindos lá do Norte d’África, ventos irascíveis que remoinham muito bem por onde lhes apetece e umas quantas chuvas eternamente vacilantes que escorregam como enguias acabadas de sair do mar. Enfim, não é fácil…
Encontrei-o sentado num montinho de terra enlameada, rodeado por troncos de árvores enrugadas, de onde pendiam galhos entristecidos pela saudade das folhas. No chão rareavam já as moitas verdes onde até há bem pouco tempo dançavam deliciosos cálices de pétalas coloridas. Um deserto de calor…
- Hei, chamei-o. És tu o roubador do Verão?
Ele olhou-me de soslaio sem esboçar um leve cumprimento que fosse. Parecia estar a descansar e reparei que tinha, presas aos dedos, três malas forradas a xadrez escocês trancadas a cadeado. Então e o raio dos baús? pensei um bocado confusa.
- Fazes o favor de soltar o Verão e desaparecer daqui de uma vez por todas? gritei-lhe, dando à voz enrouquecida pelo frio a força que faltava ao débil argumento. Não me preparara lá muito bem para o confronto com o miserável das estepes e contrariando a lógica que está sempre presente nestas ocasiões, senti as faces enrubescerem como se lhes tivessem ateado fogo, não sei bem se o da raiva ou o da vergonha.
O estúpido atacou-me então com um sorriso trocista por cima do ombro. Atirei-lhe logo uma pedra, como fazemos aos cães quando os queremos a fugir para longe com o rabo entre as pernas, mas em vez de lhe acertar, ficou-lhe a três centímetros da testa, suspensa no ar.
-És parva ou quê?
Embaraçada com o fiasco da pedrada demorei-me na resposta. E ele, aproveitando-se do meu estado titubeante, flectiu à traição os joelhos para ganhar balanço e partiu em linha recta na direcção do céu, mas não sem antes traçar um voo rasante por cima da minha cabeça, o que provocou uma deslocação de ar tão forte que me arrancou a ponta do nariz. Não acredito...
Desci a serra amuada. E também sem conseguir respirar lá muito bem.
Da próxima vez que o encontrar ele vai ver!
dezembro 13, 2009
CG
Temos toda a eternidade para dormir, dizias.
Espero meu amigo que existas agora no teu sono com a mesma intensidade com que nos ensinaste a espreitar a vida. E que encontres também alguns grupos de guerrilha, com quem partilhes pão e piolhos, e que te deixem fotografá-los na fé e na miséria, para depois nos contares o outro lado das histórias.
E se puderes perdoa-me.
Espero meu amigo que existas agora no teu sono com a mesma intensidade com que nos ensinaste a espreitar a vida. E que encontres também alguns grupos de guerrilha, com quem partilhes pão e piolhos, e que te deixem fotografá-los na fé e na miséria, para depois nos contares o outro lado das histórias.
E se puderes perdoa-me.
Um presente de cristal
A minha amiga Ana Gill tem o hábito de apanhar coisas na rua e levá-las para casa. Um destes dias, com a ajuda de mãos pequeninas, construiu a minha mais bela árvore de Natal e com aquela ternura infinita que habita nela, ligou-a aos nossos corações. As garrafas dos refrigerantes que já engoliram milhares de sedes transformaram-se subitamente em cintilantes bolas de cristal, que iluminam agora o centro da bonita aldeia de Cacela Velha. Brilham tanto que até dá para ver da lua.
dezembro 12, 2009
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